Sunday, December 31, 2006



Pertenço àquela raça de homens que não acreditava no amor.
Aquela a que a desilusão matou a esperança, e a ânsia de amar foi perdendo, com os dias, o fulgor.

Pertenço àquele género humano em que a paixão era coisa dos livros, da poesia.
Aquele em que esse sentir não existia no dia-a-dia, e o coração não era mais do que morta bomba de sangue.

Pertenço àquele tipo de animal que respirava por não saber como evitar.
Aquele em que ser amado era tempo passado, e a mulher era bicho desconhecido em que era difícil acreditar.

Pertenço a ti, agora. Afastando o medo de tornar a falhar, abrindo os pulmões para o teu beijo entrar. Sou aquele que acredita outra vez. Que ama novamente.
Aquele que a ti pertence, para sempre.

Friday, December 29, 2006

Hoje,
que tenho a alma apaziguada,
vou falar de uma noite desacordada,
em que o calor deste Inverno que não parece,
inunda de suor a carne,
e o teu corpo sem mais nada,
ferve junto ao meu.

Hoje,
que vejo o sol como ele realmente é,
e o azul do céu com cândida fé,
escrevo sobre uma alvorada que tarda.
Que se demora como um olhar distraído,
para uma estrada feita de água,
navegada por ti.

Hoje,
que tudo o resto se apaga
- com o dia -,
Que o ontem golpe de asa,
é memória passada,
levo-te pela rua com nome de papa,
sussurrando baixinho
- para não ouvires -,
meu Deus!,
como adoro esta mulher.

Thursday, December 28, 2006

Se um dia a palavra me faltar,
se a noite vestir-se de silêncio,
e adormecer sem mais nada,
não penses que já tudo foi dito,
porque o teu nome vai continuar escrito,
no íntimo do meu ser.

Se um dia a tinta secar,
se a ponta do lápis quebrar,
e eu não tiver prosa para te oferecer,
não adormeças a pensar,
que o amor acabou.
Se preciso for,
agarro na mão,
mesmo em farrapos,
e escrevo sem dor,
até ela cair.

Se um dia o meu abraço não te chegar,
se o meu olhar não bastar,
diz-me!
Agarro na sacola,
volto ao banco da escola,
e corro,
para roubar mais palavras,
que desenhem o que sinto por ti.

E se um dia chegar à tua beira calado,
se o meu pensamento parecer apagado,
não duvides:
A ausência de poesia,
é apenas falta minha de mestria,
de quantificar o quanto te amo.

Wednesday, December 27, 2006

Sou estrangeiro nesta cidade tão estranhamente familiar.
Cada árvore,
cada pedra negra da calçada
cada passada,

a durar uma eternidade.

Sunday, December 24, 2006

Demoro-me no precipício da beleza do teu corpo,
como numa manhã de domingo.
Deixo-me ficar,
imóvel,
no vácuo da noite escura,
onde só o teu nome dura,
e o cabelo tombado brilha,
como estrela cadente solidificada

Dormes profundamente.
Não vês a Lua que passa devagar,
nem os farrapos de nuvens que vêm com ela.
Respiras por pauta musical,
quase não se ouve
mas sente-se.

O espaço estremece com o vibrar dessa harpa imaginada,
a mão treme de antecipação quando vê o teu braço nu,
vestido de água.
Parecem ramos adormecidos de uma árvore mascarada de mulher.
Balançando ao vento,
apagando os gestos deixados pelo dia.

Toco-o.
Percorro o sulco das veias,
sentindo a seiva tingida transbordando em mim,
como uma constelação de ideias.
A noite continua calada,
todo o universo é silêncio,
e tu continuas a dormir profundamente.
Docemente.

Sonhas.
Eu sei que sonhas.
Com barcos de papel navegando em mar de olhos azuis.
Habito aí,
nesse pensamento expandido,
longe da aridez do basalto,
da mesquinhez do homem.
Alto,
como montanha de neve.

Debruço-me nesse espaço,
onde sou personagem secundária.
Como o dia,
que se espreguiça lá fora,
trazendo com ele a realidade sanguinária.
Vem com a manhã,
que bate à janela fechada.
Tem pressa de acordar.

Eu não.

Saturday, December 23, 2006

Ontem acordei num pesadelo,
e sonhei que era Deus,
fumando o pólen da terra por um cachimbo de água.
E o Diabo,
em desmazelo,
tocava harpa,
deixando a humanidade sem mais nada,
do que a ilusão de ser alguém.

Os anjos,
caídos e crescidos,
coçavam o sexo e cantavam vento.
E a chuva derramada sobre a terra,
dançava contigo,
num tango imaginado,
que perdurava pelo tempo.
E mais ninguém respirava.

Os fantasmas do futuro,
levantaram-se num suspiro,
e eu,
no escuro,
ouvi um tiro.
Era Deus que morria.

E então o universo levantou-se em festival,
os buracos negros vestiram-se de Carnaval,
e as estrelas despiram-se,
num Mardi Gras alucinado.
E eu acordei transpirado,
de álcool, sangue e fumo,
procurando na escuridão a tua aura,
e,
exangue,
abracei-me a ti.

Friday, December 22, 2006

Enigmática,
disseste que eu tinha medo de escrever o teu nome.
Apagaste a luz,
e deixas-te a frase ecoar pelo quarto.

Agora que estou só,
posso ver,
que não é medo isto que sinto,
mas temor,
de derramar sobre o papel,
esta estranha sensação que me parece amor.

Mas descansa,
tu e eu.
Há poemas que não querem mão para serem escritos.
Tão sinceros são os gritos de alma,
que a calma de uma página branca,
mal consegue conter.

E se isto não te bastar.
Se te soar a desculpa enganada,
prometo que para perder o medo,
grito o teu nome aos quatro ventos,
deito-o aos lentos sete mares,
e,
como uma bandeira revolucionária,
elevo-o pelos ares,
para todo o universo saber.

Thursday, December 21, 2006

És a última estrela que vejo, quando me deito. A primeira luz que o dia derrama, quando acordo.
Cometa de prata que risca flamejante a madrugada, o pôr-do-sol que se tarda, o nascer que rasga a alvorada.

És vida para lá da morte. A realidade forte de sonho surreal.
Nada em ti é calmo, nada em ti é simples. Andas como um planeta em ebulição, um asteróide perdido em erupção, deixando no ar desenhos invisíveis de uma explosão.

És nuvem branca pintada sobre azul efervescente. Floco de neve em rodopio, dançando eternamente.
Nasceste onde os cavalos bebem, onde os rios tremem pelo vale, onde os silêncios se esquecem de falar, e a dor não existe.

És o relativo, o superlativo e o absoluto. O universo em absurdo crescimento, e o bater de uma asa de papel.
Carregas a leveza do momento, o peso insustentável de um doce novembro, a liberdade de uma palavra solta ao vento.

És gota de suor que escorre pela mão. Arrepio de alma que desce até ao chão.
Gilbera que nasce em campo de batalha, a seiva dela que em mim se espalha, a primavera que tarda mas não falha.

És tudo isto, o resto e mais nada. O céu, a terra, o fogo e a água.
Só o que em ti existe em mim permanece. Como uma recordação de infância que não se esquece, e todo o meu corpo estremece, quando estou perto de ti.

Wednesday, December 20, 2006

Debruço-me sobre o abismo da palavra,
e descrevo,
com vocabulário reduzido,
obsessivo,
as sílabas que constroem o teu corpo.

Só assim o poema pode ser escrito,
à sombra de uma vela apagada,
e o verbo vai fluindo,
como sopro,
de uma tempestade imaginada.

Alinhavo as rimas,
as pontas soltas da tua alma,
o texto com que partes o dia,
o desejo,
a liberdade alva que ele sustenta,
e escrevo.

O fantasma não entende
- ninguém entende -,
não lê para lá das linhas,
da folha branca riscada de saudade,
mas a borracha não apaga a tua imagem,
derramada sobre o papel.

É marca de’água,
aberta.
Uma ferida que não sara,
tatuagem de luz,
esventrada.
Sentimento virado ao avesso,
arremesso de paixão,
que a mão carrega.
E escrevo.

Sempre.
Escrevo para sempre.
O teu nome,
o pensamento.
Até sangrar,
até chorar,
até cuspir o coração.
Aceita,
isto que escrevo.

Tuesday, December 19, 2006

Chove, e não há uma nuvem no céu. O azul cobre tudo, desde a colossal montanha despida de verde – castanha –, até onde o horizonte se confunde com o sal.

Lá longe, para lá da criança nua que desenha castelos de areia, uma vela branca flutua, mesmo antes de o mar, sem esperança, se precipitar na esteira da lua apagada.

Aqui, à minha beira, a água continua a cair. Levo-a comigo, tentando não dar por ela, e permaneço assim, vestido de líquido por uma chuva que não vem do céu. Que se derrama de dentro para fora.

E finjo constipação. Disfarçando a lágrima de hoje e de amanhã. Porque esta gota que escorre de mim, feito véu, que gela os ossos e evapora a carne, não vem do céu nem do coração, que nunca soube chorar.

Tudo agora é novo mundo. Tudo aqui é morte lenta. Que desvanece em rico seco profundo, e desaparece em praia deserta. A palavra está prescrita. A frase que não foi dita, desprende-se numa espiral de fumo, porque neste assumo de alma, o silêncio é definitivo.

Monday, December 18, 2006

Dizes que vais morrer amigo,
mas quem morre não avisa.
E esse desalento que caminha contigo,
que te alimenta e definha,
não é morte anunciada,
mas desencanto de amor.

Dizes mas não acreditas.
Porque quem ama assim a vida,
quem espera sempre que o amanhã se vista de surpresa,
não morre de tal doença,
por mais forte que seja a dor.

E tu que sentes a água como chuva,
o vento como certeza de vendaval,
não podes olhar o mar como simples gota de sal,
só porque viveste metade da vida.

E tu que amaste nos cinco continentes,
e sonhaste outros mil,
sabes que não viveste a vida pela metade.
E mesmo agora,
mesmo à deriva,
sentes que a tua alma será mais uma vez convertida.

Por isso,
não digas que vais morrer,
ninguém acredita.
Ainda há tanto para viver,
tanto mundo para ver,
que essa morte que falas,
se chegar,
não será dessa dor,
mas sim de excesso de amor.

Sunday, December 17, 2006

Só o tempo que passo contigo existe, nestes dias de irreal tristeza. Em que descubro em mim dor que não conhecia, que não sabia que podia doer assim.

Mas em ti a vida permanece. Inocente como a fé de uma criança na imortalidade. Perdura nesta doce realidade, vestida de sonho de marfim.

Somos todos feitos de erva. Tu, eu e ele. E à terra voltamos um dia. Mas é ao teu lado, que quem há muito não escrevia, encontra esta plana verdade: o ciclo fecha-se, mas não tem fim.

E como Whitman dizia, cada átomo que a mim pertence, pertence a ti também. E pensando assim adormeço, tapando esta branca melancolia, com os teus braços de cetim.

Saturday, December 16, 2006

Não sei que dia é hoje. Se sete ou oito. Sei que ontem te procurei em sonho confuso, e não te alcancei.

Sei que é Dezembro. Que são 15 e 56, e que na noite passada, enquanto amava, não te ouvi acenar adeus.

Dizem-me agora que é nove, e que foi melhor assim. Que tudo tem um fim e agora estás com Deus.

Mas não acredito na palavra de circunstância, e a ânsia de chorar e tão forte, como o peso desta eternidade que não esperei.

Friday, December 15, 2006

Mais do que a flor que depositaste em mim, do que o abraço com que me seguraste, foi o teu sorriso marquesa, que guardo hoje de ti.

No meio de tanta negra dor, de tão grande estranheza, ficou o adeus incolor e essa tua cândida forma de dizer que tudo ficará bem.

Naquele terreno cinzento, pavimentado de saudade e murchas flores, recordo o teu azul céu vir a mim. Avançavas por entre a multidão de corpos enlutados, e os teus olhos, de ternura, sorriam também.

A flor, embalsamei no carro. O abraço, sei que vou precisar de outro, mas aquele sorriso marquesa, que de mais ninguém recebi, ainda perdura, e não o esqueci.

Thursday, December 07, 2006

Pássaros ressequidos caem das árvores como folhas desamparadas num Outono de inexistência. Não cantam, não voam, apenas caem dos ramos despidos.

Não chegam ao chão vestido de folhas mortas, mas deixam no ar rastos de asas tortas. Memórias de um dia terem existido.

E na árvore, sem pássaros, folhos ou tino, resta um esqueleto de ninho. Casa vazia, desilusão, e um letreiro esquecido: Em construção.

Wednesday, December 06, 2006

Referendo

Tuesday, December 05, 2006


uma andorinha não faz a Primavera

Saturday, December 02, 2006

Dizes que caminho desalinhado pela rua deserta, tropeçando na sombra discreta de candeeiros apagados.
Que o Sol se esconde quando me vê passar, e a Lua foge quando dobro em desatino a esquina.

Dizes que não te ouço falar, mas que consigo cá em baixo escutar, a tristeza alheia da criança do sétimo andar.
Que te alimento de orgasmos carnais, mas sou incapaz de parar e dizer que te amo.

Dizes que me fecho em silêncios loucos, que não te deixam entrar.
Que sou gélido como água de montanha, e o meu coração nada mais imana do que ocos cristais de sal.

Dizes que o vento me penteia com caules de rosas azuis, e que respirar aborrece-me como uma ligeira constipação que teima, e não desaparece.
Que contemplo sem agarrar, e reajo sem nunca agir, deixando-me sempre ficar.

Dizes que não rio ou sorrio, mas também não choro.
Que sou estátua humana feita de basalto negro, resistente à erosão de sentimentos e às lágrimas que sobre mim derramas.

Dizes que sou plátano descarnado e que sempre serei assim.
Que um plátano mesmo velho, mesmo consumido por fogo que não vês, continuará a ser plátano, para lá das cinzas que caem sobre ti.

Dizes que as nuvens dançam em mim, como uma cínica tempestade de areia, que ameaça e desvanece.
Que sou seco com uma folha pisada pelo tempo, uma maré vaza de algas mortas que recusa ser navegada.

Dizes que sou esqueleto moldado de carne, prédio abandonado que arde.
Que ainda não cresci, nem nunca serei adulto, e que o amor não pode ser adúltero, senão é mármore pintado de sangue.

Dizes e eu sinto o peso da razão desolada que acompanha as tuas palavras.
Que foram ódio, e agora mágoa, tristeza despida de mais nada, por eu já não poder amar assim.

Friday, December 01, 2006

Triste e cansado este país que chamamos nosso. Onde o hospital está pintado de cinzento velho, e lá dentro mora o sangue vermelho, do nosso descontentamento. E é irreversível que assim seja, como é risível qualquer esperança num futuro de olhos abertos. O sal cegou-nos a todos, e agora quando olhamos, não mais sentimos do que morta resignação.
Somos um país de insanos mortos-vivos. Sem rumo. Perdido num desbotado livro de geografia, um desolado parágrafo da história universal. E é irreversível que assim seja, por mais velas que se acendam, palavras que se escrevam ou Fátima que se veja. Aqui, neste azul deserto azul, já nada troveja.
Ainda assim rezemos todos juntos, em busca de um paraíso ausente, pode ser que Ele afinal sempre exista, e se lembre, de nada nos ter trazido. Mas, insisto, é irreversível que assim seja, porque aqui, apenas o som da palavra permanece.
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