Saturday, December 02, 2006

Dizes que caminho desalinhado pela rua deserta, tropeçando na sombra discreta de candeeiros apagados.
Que o Sol se esconde quando me vê passar, e a Lua foge quando dobro em desatino a esquina.

Dizes que não te ouço falar, mas que consigo cá em baixo escutar, a tristeza alheia da criança do sétimo andar.
Que te alimento de orgasmos carnais, mas sou incapaz de parar e dizer que te amo.

Dizes que me fecho em silêncios loucos, que não te deixam entrar.
Que sou gélido como água de montanha, e o meu coração nada mais imana do que ocos cristais de sal.

Dizes que o vento me penteia com caules de rosas azuis, e que respirar aborrece-me como uma ligeira constipação que teima, e não desaparece.
Que contemplo sem agarrar, e reajo sem nunca agir, deixando-me sempre ficar.

Dizes que não rio ou sorrio, mas também não choro.
Que sou estátua humana feita de basalto negro, resistente à erosão de sentimentos e às lágrimas que sobre mim derramas.

Dizes que sou plátano descarnado e que sempre serei assim.
Que um plátano mesmo velho, mesmo consumido por fogo que não vês, continuará a ser plátano, para lá das cinzas que caem sobre ti.

Dizes que as nuvens dançam em mim, como uma cínica tempestade de areia, que ameaça e desvanece.
Que sou seco com uma folha pisada pelo tempo, uma maré vaza de algas mortas que recusa ser navegada.

Dizes que sou esqueleto moldado de carne, prédio abandonado que arde.
Que ainda não cresci, nem nunca serei adulto, e que o amor não pode ser adúltero, senão é mármore pintado de sangue.

Dizes e eu sinto o peso da razão desolada que acompanha as tuas palavras.
Que foram ódio, e agora mágoa, tristeza despida de mais nada, por eu já não poder amar assim.

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