Thursday, March 29, 2007

A alma desamparada caiu-me das mãos,
quebrando-se em mil pedaços de mim,
e no mármore branco desenham-se a vermelho,
os estilhaços do que fui.
Pálida imagem, que o teu amor dilui.

Recolhes pedaço a pedaço,
como se de um estimado vaso se tratasse,
calcorreando o chão para que nem um estilhaço falte,
e o meu corpo não fique órfão,
dessa parte que me fugiu da mão.

Encontras tudo.
Reconstruindo o homem que fui,
beijando-me com lábios de veludo,
despejando, em mim, a vida,
e o meu coração acorda e respira,
para este amor que tanta falta fazia.

E o mármore amanhece lavado,
as manchas evaporadas e a alma cicatrizada.
O chão está limpo,
e o corpo, habitante do Olimpo,
aguarda apaixonado,
que o chames para junto do teu.

Estou pronto para amar,
e já me entreguei a esse sentir,
certo que és a mulher que quero vestir,
encontrando-te para lá do futuro,
em cada patamar cronológico da minha linha temporal,
neste amor morfológico,
que nasceu à beira-mar.

Monday, March 26, 2007

Este poema é um bom lugar para morrer,
e para viver também.
Não se morre realmente num poema,
nem se vive plenamente, também.
Ama-se, desencontra-se.
Chora-se, ri-se.
Mas não será isto efectivamente viver?
Que seja então assim.
Porque aqui,
no tempo que dura uma rima,
entre uma estrofe e outra,
nascem, crescem e morrem sentimentos.
Pensamentos loucos,
vagueiam roucos pelas palavras,
fantasias e reticências,
derramam alegrias nas pausas.
Fala-se de amor, de dor.
Escreve-se paixão até doer a mão.
O coração aperta-nos e as letras libertam-nos,
vive-se por entre as sílabas carregadas,
morre-se em cada vírgula encravada,
desespera-se, altera-se, deixa-se ficar.
Nada se diz, tudo se revela.
A poesia é vida,
e nela quero morrer,
para renascer eternamente,
neste amor ardente,
que é desenhar o teu nome.

Thursday, March 22, 2007

Aceita esta gilbera de chapéu de palha,
porque o amor não nasce quando calha,
mas quando o homem menos espera.

Deposita em ti este postal,
aninhado sobre o teu corpo de mulher sensual,
onde o meu desejo é astro que orbita.

Permanece assim com a flor aberta,
enquanto todo o meu coração desperta,
e o meu olhar salgado dilui-se neste amor.

Recebe o papel colorido,
e guarda-o como reflexo deste sentimento nascido,
que viverá pelo voo deste futuro adorável.

Monday, March 19, 2007

Abre a porta mais uma vez para o lápis entrar,
e deixa-me ver-te adormecer.
Serei todo silêncio.
Imóvel,
e apenas o arranhar do papel pode denunciar a minha presença.
Não vou escrever poesia
- que seria pouca e de nada valia -,
nem tomar-te nos meus braços.
Só quedar-me a ver os traços,
do sorriso com que sonhas.
Não me atrevo a desenhar o contorno do teu corpo,
nem a sombra do gesto no fundo branco do quadro.
Vou só,
de olhos lassos,
contar os minutos que passo,
subtraindo-os ao tempo,
que se demora nesse espaço.
Talvez ajeitar-te o cabelo
- não prometo que não o faça -
ou cobrir-te com zelo
- nada que a noite não desfaça -,
mas beijar-te,
garanto,
só mesmo se os teus lábios procurarem os meus.
E se apesar do esforçado silêncio meu,
ouvires daqui algum suspiro,
descansa,
é só a ânsia,
do meu tolo coração a falar.

Friday, March 09, 2007

A noite acorda-me com um beijo plácido,
desculpando-se por interromper o sono,
mas o sonho vive acordado,
nos braços do silêncio entrelaçado,
em que os lábios se colam
e eu permaneço estático,
sentido a humidade húmida,
da boca que me desperta.

Não te desculpes noite,
por tão suave acordar.
O porto não dá justificações ao barco que nele deseja ancorar,
o dia não se aborrece quando pressente o Sol entrar,
nem o caderno de poesia se fecha se a letra começar a chorar.

Acorda-me outra vez, noite.
Hoje, amanhã e depois.
Sempre!
Interrompe o sonho que a manhã fragmenta,
e deixa entrar o amor pela madrugada adentro,
para que nele o meu corpo pernoite,
e a alma estendida descanse nesse plano epicentro,
onde todo eu existo, na plenitude do sentir.

Beija-me novamente,
noite vestida de mulher.
As dunas ressequidas não afastam o abraço líquido do mar,
os amantes não se escondem da branca luminosidade do luar,
nem eu adormeço enquanto os nossos lábios não voltarem a se encontrar.

Thursday, March 08, 2007

Apaixono-me perdidamente em cada silêncio deste amor poético,
e a todo o momento desperto,
para o amor profético,
que despejas sobre mim.

Deixo-me embalar pela música que o teu corpo emana,
naufragando na palavra e na chama,
e estejas tu onde estejas,
eu permaneço, contemplando-te assim.

Este sentir que julgava perdido,
regressa agora imenso e vivo,
pela mão do sentimento que trazes vestido,
num sorriso recortado a um arlequim.

Aí habito, morro e desejo viver,
nesta espécie de felicidade em que não há sofrer,
viajando na sensação que se derrama como predestinação,
e fico com a impressão, que este sentir não tem fim.

Wednesday, March 07, 2007

Só existo em ti,
e em mim só tu existes.
Escrito assim parece romance,
mas foi isto que senti,
hoje,
quando acordei em transe,
num sonho que é só meu.

Esta é a minha herança,
a perseverança do ferro e do diamante,
Ser mais do que amante,
mar e não maré,
amar e ter fé,
que sou o que procuras,
que sou aquele que em ti nasceu.

Só tu em mim perduras,
e em ti encontro-me.
Barco branco empurrado pelo vento,
deixando o mar de tormento,
até ao porto que mora no teu olhar,
no teu sentimento.

Este é o meu testamento,
o meu legado.
Amar e ser teu amado,
pertencer aos gestos do corpo,
voar pelo labirinto plano da tua alma,
deixar-me ficar aí,
nesse elemento incorpóreo,
onde reside o amor,
a fome,
e o meu sustento.

Tuesday, March 06, 2007

Fui avô...

Monday, March 05, 2007

Mergulha no líquido azul desta água, e ouve o silêncio da noite desbravar a humidade do ar. Vê os mil reflexos de luz a dançarem em rodopio com o teu corpo, e a humidade do ar evaporar, no momento solidificado, que atravessa o meu olhar.

Deixa-te ficar aí. Onde a objectiva imortaliza o objecto do meu desejo, flutuando neste ensejo, de tornar tão infinito este segundo, como o amor que me veste o peito, desde o fundo.
É esse o teu mundo. O da água, da noite, da cor, da minha devoção. É essa a tua canção. A do jazz retumbando pela sala azul, a da suave voz entoando a paixão, em que mergulho, como no líquido azul desta água, que te abraça.

Sunday, March 04, 2007

O medo é incorpóreo. Fumo invisível que percorre as vísceras da alma, expandindo-se pela carne, num sufoco liso. Ondulado, que chega sem ser anunciado. O riso risível do diabo, sacudindo o corpo. Libertando lágrimas de arrependimento. De sofrimento. De culpa. O sal não desinfecta o olhar queimado pela visão vaga do inferno. Toldado pela palavra desiludida. Certa. Cruelmente certa. Que ecoa em mim como um tambor de guerra, chamando o homem para a manhã incerta. Para a despedida. Para a morte do dia seguinte. Para a batalha sem vencedores. Só vencidos. Derrotados. Guerreiros adormecidos caminhando pelo campo de espinhos. Empunhando espada de papel e chicotes de cordel. Temerosos. Inofensivos. Estupidamente pacíficos. Todos. Avançando pelo pesadelo molhado, arrastando os pés sincronizados em direcção ao inimigo que não compreendem. Que não querem compreender. Vestindo ódio induzido, já esquecido de causas e razões.
Estou no meio deles. Os meus pés são os deles. Trago na mão despida as unhas enferrujadas pelo sal. Os dedos descarnados pela dor. A tiracolo, num cinto de pele de criança, um punhal elástico em tons cinzentos. Na cabeça mil e um tormentos, e avanço com lama vermelha pelo pescoço.
Não te vejo.
Procuro-te tentando não tropeçar. Procurando não cair desamparado. Não ser engolido pelo batalhão que continua cego a subir a montanha.
Falta pouco para o cume.
Para as fileiras se cerrarem e carregarem sobre o inimigo espelhado. Sobre o reflexo monocromático do homem, que aguarda do outro lado o momento. Em fileira simétrica.
O sentimento não mora aqui. Neste desfiladeiro de papoilas assombradas. Sob o céu verde da raiva surda, muda, suja pela história, só o desalento respira.
O barulho é ensurdecedor.
Aterrador.
Não avanço. Nada existe do outro lado, para além do reflexo de mim mesmo.
Deserto da guerra, e a tua imagem aterra ao meu lado.
Despes-me das armas. Dos preconceitos. Do pré-concebido e de tudo o que eu julgava sabido.
Abraças-me.
“Vai ficar tudo bem”, dizes com um gesto, que fragmenta em poesia o universo.
O campo não era real.
Nada é real.
Tu és.

Saturday, March 03, 2007

Abro-te a porta do meu mundo,
como quem escancara uma janela para a luz do dia entrar,
e deito-me a ver e a pensar,
que este amor profundo,
só pode ser o tempo a amar.

Entras por ele em passos largos,
vestindo o sorriso que me cativa,
abraçando a palavra agora viva,
que afugenta os dias amargos,
e vai compondo esta narrativa.

Permaneces aqui,
no espaço onde habitava a solidão,
possuindo todos os recantos do meu coração,
e eu contemplando escrevi,
o teu nome como uma oração.

Não saias agora do lugar onde já resides,
não deixes vago o espaço que iluminas,
onde és fogo, ar, terra e as águas cristalinas,
porque neste mundo em que vives,
as palavras que poetizo és tu que assinas.

Friday, March 02, 2007

Espreguiça-se a manhã sem Sol,
respirando a luminosidade filtrada pelas nuvens.
É Inverno mas não parece aqui sê-lo,
nesta manhã sem Sol,
em que me espreguiço no Verão do teu corpo.

O país cinzento fica lá fora fechado,
e o calor aqui guardado,
é o reflexo do amor evaporado,
que nos abraça nesta manhã sem Sol,
que dizem ser de Inverno.

Aqui, enquanto me deito à tua beira,
é a Primavera que cheira,
a maracujá e à paixão entranhada na pele,
despida como árvore outonal.
Todas as estações em rodopoio,
neste quarto recortado ao tempo,
e ao Inverno que dizem existir lá fora.
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