Monday, April 23, 2007

Sinto saudades dessa hora,
que não vivi,
contigo.
Reclamo-a agora,
neste dia que o amor me aflora,
a ti
que me dás abrigo.

(hoje o passado é postigo)

Deixa que escreva,
isto que digo,
que liberte do coração
a palavra,
estendendo a mão,
como quem lavra,
o papel,
a terra,
mais nada.

Sinto saudades desse tempo,
que não respirei,
a teu lado.
Vim hoje buscá-lo,
amanhã cá estarei,
(e depois)
a vivê-lo,
apaixonado.

Thursday, April 19, 2007

Gaivota que voas rasante pelo mar adentro,
leva na tua asa este farrapo de gente,
que voa invisível pelas páginas,
e inquieta-se com o teu canto risível,
onde cabem mil crianças imaginadas.

Pica ave marinha pela nuvem esfarrapada,
faz ouvir a tua liberdade,
o teu bater de asa,
e deixa-me escutar essa algaraviada,
com que a mulher adormece, descansada.

Mergulha na noite,
livre e alada,
navega pelo sonho e deixa rasto no céu,
para que te siga no encalçe do véu,
abraçado à minha amada.

Vai e não olhes o passado,
deixa ser futuro esse voo ritmado,
impulsionado pelo vento,
agarrando cada momento,
e deixa-me voar contigo.

Wednesday, April 18, 2007

Cresce uma mão que me toca,
nascida da água efervescente,
traz uma ideia que se desloca,
e um amor ardente.

Dedos saturados de sal,
procurando no meu corpo a primavera,
ao longe descansa à chuva o areal,
ao perto reside esta mão sincera.

Respira o amor em vapor azul,
caindo solidificado sobre a carne adormecida,
voo de pássaro para o Sul,
onde a alma acorda aquecida.

Água em ebulição beijando o peito desnudado,
olhos fechados, coração aberto,
e o meu corpo todo inundado,
por este poema submerso.

Tuesday, April 17, 2007

Este dia que é água, que é melancolia,
traz do vento o perfume irreal da primavera,
caindo sobre mim vestido de magia,
onde no céu metalizado desponta rosa gilbera,
e morre levado por grande ventania,
esboço de sonho feito quimera,
enquanto Deus senta-se a escrever poesia.

Escrevo também eu, algo que se assemelha,
desenho teu de letra ardente,
palavras e frases feitas lenha,
nadando em água efervescente,
a mão arde e a caneta estranha,
porque perante esta lua luminescente,
as palavras do poeta quase parecem lenha.

Será qualquer coisa de intermédio,
isto que desenho para apagar o sofrimento,
amor, sal, um dedo de tédio,
um verso, um tormento, um momento,
escrever é tudo o que sei, grande remédio,
derramar sobre o papel o calor, o vento,
e o grande, o pequeno e o médio.

Poetizando a futurologia do presente,
o ontem e o amanhã abraçados numa figura de estilo,
a realidade imaginada que o coração sente,
palpável e real como um vislumbre de exilo,
profundamente real, porque o verso não mente,
mortal como um dedo no gatilho,
porque esta tinta é sangue incandescente.

A mão desliza, dança a cada segundo,
viajando pela página como barco pelo mar,
traz nos dedos o peso do chumbo,
do coração o mais puro e sentido amar,
deste amor crescido do meu fundo,
em que és a vida, a morte e o mundo.

Monday, April 16, 2007

Do interior das minhas pálpebras fechadas,
vejo a nudez do teu corpo,
vagueando pela nudez da madrugada,
e anseio fazer parte dessa noite desejada,
nem que seja como personagem secundária,
da alegoria alada trazida pela poeira.

Esta minha ingénua fantasia,
quimera de pólen futuro,
é habitar-te como em mim tu resides,
mascarar-me do teu nome e decompô-lo no papel escuro,
deixar de ser sólido, ser o que existes,
e respirar esse simbólico poema que exalas.

Não é real esta alegria, nem palpável tão pouco,
mas é assim que amasso louco o sonho,
e por trás das minhas pálpebras fechadas,
esvoaçam palavras caladas,
condensadas sílabas inteligíveis,
que a manhã ilumina, torna tangíveis.

Afinal não foi sonho ou pensamento tresloucado,
ao fim ao cabo amar-nos é possível à luz do dia,
e com as pálpebras abertas
- as minhas, as tuas -,
vejo paixões nuas, despertas,
e sei que a noite não mentia.

Sunday, April 15, 2007

Um resquício de sonho brilha no fundo da estrada,
um sorriso se alevanta à sombra da escada,
a cidade inteira dança animada,
pelo compasso dos gestos que fazem a alvorada.

Dizes que me amas e eu absorvo a palavra,
vejo as chamas rasgarem a lava,
a noite escura chega iluminada,
pelo desenho de uma estrela que não se apaga.

E eis que a lua faz a sua entrada,
declamando o teu nome, endeusada,
e o amor espreguiça-se como uma fada,
pela carne da minha alma acordada.

Respondo que sim, que és a minha amada,
que sempre foste, mesmo quando nem imaginava,
e a minha mão vagueava desasada,
pela solidão de não reconhecer o que amava.

Passado que passou como nuvem amaldiçoada,
agora o tempo é de magia, é de água,
e o futuro vive-se sem mágoa,
pela noite ser Sara, ser desejada.

Saturday, April 14, 2007

Dispo-me, anónimo, sobre o papel queimado,
marcando o corpo com tinta efervescente,
odiando perdidamente cada letra trocada,
cada palavra truncada,
como odeia aquele que não ama,
olhando, atónito, para a lua luminescente.
E amaldiçoo-o a mão hesitante,
e o coração expectante,
pede para morrer.

Fecho-me e deixo a palavra respirar pelos átomos que compõe a página,
e imagino uma margem, um rio,
o lápis um navio,
e este poema deslizando pela água,
a viagem até ao teu nome.

Por fim acordo com fome,
da tua alma, do teu corpo,
resisto ao desejo de a matar,
o tempo urge, é preciso acabar,
esta febre de escrever quase parece viver,
o vento ruge, parece saber, o que o mar distante
- morrendo contra a praia -,
diz conhecer.
A vida desmaia,
num lento esbracejar,
o dia acorda a gotejar,
e tu vais rindo pela madrugada fora.

Friday, April 13, 2007

Vivo no intervalo que respira entre o bom dia e o até amanhã.
No outro sonho que esse tempo não acaba,
perdurando na aba de uma manhã de Novembro,
em que o vento e a maresia abraçaram-se em silêncio,
a escrever esta poesia.

Fantasio pela madrugada adentro,
que a rotação do Mundo pára,
quando os meus e os teus olhos se fecham
e a transladação do planeta só continua,
quando a esse tempo congelado dizem adeus.

E é a esse assossego desassossegado que me agarro,
acreditando que todo o universo foi desenhado para nos amarmos,
a Terra apenas existe para nela nos sentarmos,
e todos os elementos são reflexo,
da poeira cósmica que formou este amor.

O resto do tempo não existe,
persiste como acessório,
como interregno adormecido deste sentir,
promontório com vista para o mar,
porque este amar, só em nós pode florir.

Sunday, April 01, 2007

Aflige-se, por vezes, o coração, quando lhe assaltam pensamentos da lua acendida atrás das montanhas de sombra. O reflexo branco esbate-se, pálido, no mar silencioso, e a espuma aproveita e adormece num lençol de pedras roladas. Lá longe, do outro lado da cidade de persianas fechadas, eclodem os gritos calados dos que já não choram, e o coração aflige-se por conhecer o nome individual de cada um desses sabores salgados. Por voar pela viagem imaginada dessas lágrimas, e nada mais guardar do que um punhado de postais amarelecidos pelo esquecimento. E aflige-se o coração por tanto sofrimento soprado pela noite e pelo pensamento que a lua acendida carrega: O que restará do meu nome se não estiveres cá para o chamar? Não o reconhecerei como meu, e a minha voz, decomposta em suspiros, terá o sabor do silêncio. Do teu silêncio.
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