Friday, May 30, 2008

Guarda na mão o cansaço da véspera,
porque o dia amanheceu doente de palavras,
e as tuas asas estão guardadas,
no sonho recôndito de uma infância.
Os homens não voam,
se voassem eram nuvens passageiras,
impelidas contra o horizonte.
E dos estilhaços,
renasciam espumas e ondas,
trazidas do mar alto,
para morrerem em silêncio,
na invisível praia de basalto.

É esse o marulhar que traz a manhã,
debruça-te sobre a febre alta da maré,
e apaga o ruído da cidade dos homens,
até ficarmos nós, sós,
à sombra da árvore do nascimento.
Só tu podes resgatar as palavras,
do mágico lugar onde se refugiam,
quando o dia amanhece assim,
mudo na cor,
cinzento na voz.
Agarra-o com fervor,
com a fé das crianças que voam,
para que o sonho não se desfaça,
num punhado de sal,
morrendo ao sol,
num nicho de rocha.

Friday, May 16, 2008

Quando os olhos se encostam para trás, e descansam como se dormissem no teu regaço, sonho descansado ou coisa assim, recordam a cana de pesca apontando o céu. Coisa estranha o basalto moldado pelo mar, e o sal, gota constante de cristal, percorrendo os atalhos da rocha, e eu sentado a ver-te pescar, no abismo daquela encosta.

Quando o verde e o vermelho se misturam numa camisola suada por uma tarde de Verão, é domingo e estou sentado numa resma de livros, com os pés baloiçando perto do chão, e nos dedos a recordação de um rebuçado de leite. Sou criança entre homens, vejo sombras de jogadas, repito-as com a mão e uma bola de palavras, em gestos imperfeitos.

Se me perguntarem quem marcou, aponto para cima, para ti que não reclamas dos passes falhados, dos peixes que não mordem. Que festejas cada golo, cada peixe, como um nascimento. Que só oiço o teu descontentamento, quando os homens abandonam o estádio. "Porque saem? Ainda não acabou."

Porque saíste tu, com o jogo da decorrer?

Friday, May 09, 2008

Falta mundo nestas palavras,
debruçadas à sombra do mar,
reféns de um sonho de asas,
pedem o céu, deixam-se ficar.

Há em mim esse desejo,
de atirar-me ao papel feito cometa,
rasgar a alma e abandonar o cortejo,
a golpes certos de caneta.

Mas entre o querer e o fazer,
está a procura da rosa de Pina,
contínua viagem ao anoitecer,
escrita com o sangue da minha ruína.

E na vertigem de tanta metáfora, baloiço
no abismo tingido da prosa,
pode ser esse o meu arcaboiço,
o lugar onde nasce a minha rosa.

Talvez possa então,
vagar o corpo na letra clara,
agarrar esse mundo que me falta à mão,
e depositá-lo aos teus pés, Sara.
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